“No Brasil, parece que ser velho é deselegante”, diz psicóloga

É o que afirma Junia de Vilhena doutora em psicologia

01/07/2018

Junia de Vilhena é doutora em psicologia e coordenadora do LIPIS, o Laboratório Interdisciplinar de Pesquisa e Intervenção Social, na PUC-Rio. Ali funciona o Envelhecentro, núcleo de estudos que tem como objetivo abordar os problemas do envelhecimento em sua dimensão psíquica e social, e que mantém uma parceria com a Universidade de Coimbra desde 2012. Na opinião da professora, o Brasil está mergulhado num clima de gerontofobia: “parece que ser velho é deselegante”, ironiza. “As pessoas vivem em estado de negação, como se não fossem morrer. Velhice não é diagnóstico que demande intervenção terapêutica, mas é comum que os velhos que nos procuram se queixem de estar ‘sofrendo de velhice’”, completa. O atendimento a pacientes é feito em rodas de conversa, nas quais a prioridade é ouvir o que os idosos têm a dizer. Os temas mais recorrentes são a perda do poder aquisitivo depois da aposentadoria; doenças crônicas e as limitações que trazem; e conflitos nas relações familiares, principalmente o afastamento dos filhos.

Junia de Vilhena: velhice não é diagnóstico que demande intervenção terapêutica (Foto: Mariza Tavares)

Junia de Vilhena: velhice não é diagnóstico que demande intervenção terapêutica (Foto: Mariza Tavares)

Junia de Vilhena: velhice não é diagnóstico que demande intervenção terapêutica (Foto: Mariza Tavares)

 

Segundo Junia, uma sociedade que valoriza apenas a juventude só tem a perder. Por isso propõe uma reflexão sobre a diferença entre juvenilidade e jovialidade: “a juvenilidade é biológica, está ligada à idade. Já a jovialidade é existencial e simbólica. Jovialidade vem de Júpiter, jovis no latim, se inscreve numa condição divina. Trata-se de um outro nome para a alegria, para a aceitação da vida tal qual ela nos aparece. Jovens e velhos se encontram na alegria da jovialidade”. No entanto, explica que o chamado “valor simbólico” do indivíduo diminui com o envelhecimento, colocando-o à margem: “o velho não é mais visto como depositário do saber. Num primeiro momento, envelhecer parece ser pior para a mulher, já que o modelo feminino está calcado na beleza, na estética. Entretanto, a médio e longo prazo, o risco acaba sendo maior para os homens, que ainda atrelam sua identidade ao trabalho. Quando essas insígnias do ambiente profissional são retiradas, com frequência ele não tem outra rede de proteção onde se apoiar. As mulheres, mesmo as que têm uma carreira e trabalham fora, detêm o domínio do espaço da casa, além de uma maior capacidade de se relacionar”.

Em maio, ela foi palestrante no Congresso Internacional sobre Envelhecimento, realizado na Coimbra Business School, e chamou a atenção para o preconceito em relação à sexualidade e à homossexualidade de idosos. Lembrou a polêmica causada pelas personagens de Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg na novela “Babilônia”: “avós não devem fazer sexo, e com alguém do mesmo do mesmo sexo é impensável”. Afirma que a reinvenção da velhice terá que ser um processo coletivo: “há muitas perdas, não somente de cônjuges, familiares e amigos, mas relativas ao próprio corpo. É preciso viver o luto, mas também descobrir e redescobrir prazeres, como as coisas de que gostávamos e nas quais não investimos porque era preciso trabalhar e criar os filhos. É preciso ressignificar as representações acerca da própria vida e da posição social e simbólica do velho na sociedade”.

Mariza Tavares

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